A PEQUENA JOANA

 



                Hoje poderia ser mais um dia normal. O sol brilha como nos dias de verão, faz calor, mas não aquele calorão que faz suar o tempo todo; eu gosto de fazer formas e desenhos engraçados com as mãos aproveitando a sombra. Como de costume estou esperando minha amiga chegar para nossa aventura diária.

            Todo dia minha mãe me deixa sair para passear e brincar com a Joana que quase sempre é pontual, porém hoje vai ter briga, ela nunca se atrasou tanto. Enquanto estou sentado na beira do jardim a aguardando, fico imaginando como vai ser nosso dia.

            Geralmente a gente sai andando, às vezes a carrego com as mãos e gostamos de andar. Joana anda devagar e isso me irrita um pouco, mas gosto tanto dela que acabo nem ligando, me importa mais a companhia agradável. Acho que não comentei como ela é linda, toda delicada... Por ser gorduchinha dá ainda mais vontade de apertar. A pequena Joana, como todo mundo a chama, gosta muito de plantas e onde ela vive tem muitas delas, normalmente eu a encontro próximo ao pé de limão que fica no meu jardim.

            Joana sempre vem exatamente às 9h para nossa diversão. Atravessamos vários lugares, sempre atentos aos possíveis perigos, mamãe sempre me alertou quanto a isso. Algumas vezes a gente canta e aposta quem chega primeiro do outro lado. Eu sempre ganho. Deve ser porque ela é pequenininha e eu tenho passos mais largos; se parar para pensar nem é tão justo assim. Mas o que mais me impressiona é que ela nunca liga para isso, o importante para ela é estarmos juntos.

            Sempre tento mudar nossa rota e desbravar novos lugares, mas ela insiste em fazer o mesmo caminho. Eu não acho tão divertido assim quanto descobrir coisas novas, mas admito que é bem legal brincar com a Joana. Apesar de ser de poucas palavras, ela me diz muito; me ouve quando precisa e sabe todos os meus gostos. Joana, a pequenina, sempre parece alegre e quando qualquer pessoa a vê parece ficar feliz também. Ela tem este poder. Quem sabe um dia, de tanto conviver, eu consigo ser como ela.

            Acho que eu posso dizer que ela é minha melhor amiga. É tão íntima, que além de contar tudo, eu a chamo de Botãozinho. Não sei se é porque considero o nome Joana adulto demais para ela, mas acho que ela tem cara de botãozinho. Quando minha mãe ouviu eu falando isso pela primeira vez, ela riu muito, mas não deixei que Joana ouvisse para não se sentir ofendida, afinal não era dela, mas eu sabia que minha mãe poderia ter se segurado mais na frente das visitas. Ela mesma me ensinou que devemos disfarçar em alguns momentos. Mas tudo bem, Botãozinho sempre é bem vinda em casa.

            Desde que a conheço ela só come coisas naturais, não gosta muito da nossa comida... Quando a levo para almoçar com a gente, ela fica só na saladinha. Ela é uma espécie rara, diz sempre mamãe. E isso faz com que eu não ligue de não ter outros amigos, afinal a minha melhor amiga é uma raridade. Acho tão legal ter alguém tão exclusivo só para mim. Quero dizer, não me pertence, como uma propriedade, mas alguém para chamar de minha amiga.

            Botãozinho está demorando demais. Vou até onde ela mora para descobrir o que aconteceu. Ah se ela estiver dormindo e esquecido de mim...

            Ao chegar em seus aposentos vejo uma cena perturbadora. Botãozinho não se mexe. Cutuco para ver se ela reage, chamo por ela, pelo nome e apelido, mas mesmo assim ela não dá sinal de vida. A culpa toma conta de mim por julgar que ela tinha me abandonado, quando na verdade ela me deixou para sempre.

            Com muito cuidado a carrego e levo até mamãe que constatou a morte. Com uma tristeza profunda, como se o meu mundo tivesse acabado, com uma colher, cavo um buraquinho no jardim, embaixo da árvore em que morava, a cubro e sobre ela coloco um dente de leão, sua flor favorita. Choro muito, até o ar me falta. Minha mãe está comigo o tempo todo e me abraça forte.

            Ainda impactado, sei que hoje é outro dia. Ontem foi a última vez que brinquei, me diverti, conversei e senti alegria ao lado da pequena Joana. Eu não sabia que seria a última. Mamãe disse que com o tempo a tristeza passa e apenas me lembrarei das nossas aventuras.

            Eu realmente espero que seja assim. Ainda estou sem chão, mas quero me lembrar de cada momento com minha melhor amiga joaninha.


Comentários

  1. Adorei Bruno!! Parabéns...adorei A Pequena Joana!!

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    1. Ah, que bom que gostou! Fico muito feliz, ela é uma fofinha mesmo rs

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  2. Muito lindo! Cada ser, por menor que seja, nos deixam marcas, marcas essas que nos fazem sermos o que somos! 😍

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    1. Sim... nossos amiguinhos de diversos universos fazem nossa vida melhor, sempre :)

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  3. Muito lindo ,como sempre amigos são amigos mesmo q seja uma joaninha não importa o tamanho🥰❤️

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  4. Muito reflexivo
    Amei o texto
    Nós faz repensar no hj e aproveitar cada momento de nossas vidas
    Nunca sabemos como será o amanhã

    Parabéns

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    1. A qualquer hora pode ser a última e a gente nem sabe...

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  5. Minha Alma antiga favorita é vc!!!! Meu amado amigo!!!!!🌻🐞💗

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  6. Muito lindo!! Revivi algumas memórias afetivas de quando eu era criança. Muito obrigada por nos fazer viajar no tempo, Bruno!

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    1. Que delícia! Essa sensação de reviver as boas lembranças são demais... Obrigado pela leitura <3

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