POTINHO DO BEM


Esta semana em meu Instagram (@obrunolopez), eu pedi para que me enviassem palavras positivas. Essas palavras vieram, na maior parte, de amigos e pessoas próximas que dedicaram uns segundos para emanar boas energias positiva através de palavras que me definissem de alguma maneira para eles. Como acredito que tudo que é bom deve ser passado para frente, decidi escrever um conto onde utilizei as 23 palavras doadas ao meu dia. O conto não é necessariamente feliz em todos os momentos, afinal amo um drama, mas as palavras que vieram a mim como presente, certamente entrarão na vida de todos que lerem com muita positividade e alegria.
As palavras que me presentearam foram:

LUXO | LINDO | AMOR | DETERMINADO

ALTRUÍSMO | WANDERLUST | ROCK&ROLLER COASTER

ENERGIA | RECIPROCIDADE | MARAVILHOSO

ESPERANÇA | ALEGRIA | CARISMA

DETERMINAÇÃO | FELICIDADE | SORRISO

PAZ | HO’OMAU | BEIJOS DE LUZ | JUNGLE CRUISE

FRATERNIDADE | TALENTOSO | HUMOR

 

Potinho do bem


             Alguns dias começam com esperança. Foi assim que eu me senti há alguns meses quando meus melhores amigos, Luiz Henrique e Vítor resolveram me fazer uma surpresa.
           Mesmo quando tudo parece que vai dar errado e você resolve desistir da felicidade, o destino pode ter um bom humor inimaginável e mudar o rumo da sua história.
           Eu me chamo Luan e no auge dos meus 22 anos descobri que tinha câncer de pulmão. Os tratamentos sugavam minha energia e a cada dia que passava e não via melhoras, minha determinação em querer vencer aos poucos ia embora. Minha família e meus melhores amigos sempre me apoiaram e estiveram ao meu lado em todos os momentos. Nunca fiquei só.
           Vítor sempre foi o mais talentoso da turma, e por isso, em todas as minhas sessões de quimioterapia ele estava presente com seu violão para a alegria de quem o ouvia e delírio das garotas que ficavam babando por ele. Nunca entendi bem esse sucesso que os caras que tocam violão fazem com as meninas, mas parece sempre funcionar.
           Luiz, era o amigo que qualquer um gostaria de ter. Carinhoso, o queridinho das mães, simpático e nunca deixava de lado seu altruísmo. Muitas vezes eu pensava que ele colocava as pessoas antes dele próprio em qualquer situação. Comigo nunca foi diferente. Todos os dias me visitava e me fazia companhia, mesmo quando não tinha assunto ou eu estava indisposto demais para falar.
           Eu, bem, como posso dizer? Era o mais lindo do “rolê”, não podia negar. Tudo bem, isso não era verdade! Aliás eu era bem normal, se é que podia me definir assim. Não sabia dizer exatamente minha posição no grupo, mas talvez eu vencia pelo carisma. Na verdade, embora cada um tivesse seu ponto forte, acredito que nossa união sempre se consolidou pela fraternidade e reciprocidade. Nunca abandonamos uns aos outros. Fomos amigos desde o ensino fundamental. Inseparáveis eu diria. O terror das professoras primárias.
           Apesar de seguir corretamente todas as fases do tratamento e estar determinado a sair daquela situação, muitas vezes o quadro clínico piorava e minha resistência diminuía.
           — Qual o seu maior sonho? — Perguntou minha mãe em uma das visitas.
           Aquela pergunta me pegou de surpresa. E não uma surpresa tão boa, porque eu sabia que apenas pacientes considerados terminais precisavam e tinham o direito de responder aquela pergunta.
           Os olhos de minha mãe confessavam o desespero e tristeza ao me perguntar, mesmo ela tentando disfarçar e agir com normalidade. Eu, que não queria a ferir ainda mais, e também não podia ser hipócrita em fingir que estava tudo bem, apenas disse:
           — Disney.
           Com um abraço bem forte dela e do meu pai, que acabara de entrar no quarto, eu senti uma emoção que nunca havia pensado que seria possível. Aquilo era amor.
           Embora fosse impossível não ter momentos de tristeza e coisas ruins passando pela cabeça, eu sempre tentava me concentrar em uma palavra havaiana que minha oncologista me ensinou: Ho’omau, que queria dizer, ter persistência para continuar sem desistir. Ela sempre dizia isso quando chegava e quando se despedia. Era só mentalizar.
           Depois de alguns dias internado eu recebi a tão esperada alta para viajar. Meus pais planejaram tudo e combinaram com meus amigos. Eu mal podia acreditar. Eu iria para o maravilhoso mundo da Disney com os meus amigos mais queridos.
           Eu sempre quis viajar, mas não era algo que fazíamos com frequência, principalmente depois que comecei os tratamentos, afinal meus pais gastavam muito dinheiro além do que o convênio médico cobria. Então essa aventura seria um marco na minha vida. Talvez esse desejo fosse a última coisa legal que eu faria. Eu nem sei bem qual loucura meus pais fizeram para conseguir com que eu fosse para lá, mas eu estava em êxtase. Eu nunca sonhei em ser um wanderlust, mas de uma coisa eu sabia desde criancinha, eu queria ir para Orlando ver o Mickey.
           Os dias que antecederam a viagem foram os mais importantes da minha vida até então. Eu pesquisava tudo sobre os parques e a cidade, preparava as documentações, autorizações do hospital, ouvia as recomendações dos meus pais e pirava só de imaginar como íamos nos divertir. Não sei o que seria mais mágico, estar lá, ou toda essa emoção que me arrancava um sorriso por minuto só de preparar os roteiros e me imaginar nos brinquedos e atrações.
           Naquele momento eu não estava muito preocupado com o câncer, se o hotel era de luxo ou se o voo teria embarque prioritário, eu queria saber mesmo se eu visitaria primeiro o Jungle Cruise ou a Rock&Roller Coaster.
           Toda essa rotina agitada e empolgante foi interrompida por tosses, falta de ar e movimentações de pessoas desesperadas perto de mim. Eu não conseguia ouvir mais nada. Podia ver com os olhos fechados alguns lampejos brilhantes, pareciam beijos de luz espalhados pelo ar tentando me atingir.
           Só consigo me lembrar que quando um daqueles beijos me alcançou, eu senti que a viagem havia começado. Em frações de segundos, tudo que fiz em vida passava pela minha cabeça, eu conseguia me alegrar e ver que muita coisa valeu a pena e mesmo sem poder ser um jovem saudável, eu sei que amei e fui muito amado. Cada coisa boa que fiz, falei e ouvi pareciam estar guardadas em um potinho de vidro com fundo infinito, e como se fosse magia, elas saltavam de lá me abraçando e me acolhendo de alguma forma.
           Depois daquele turbilhão de sensações, descansei em paz.

Bruno Lopez 

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