A ÁRVORE DO AMOR

   

             Hoje talvez seja o dia mais triste de que me lembro. Talvez ele esteja comparado ao dia em que perdi um tio querido. Embora a tristeza se dê por motivos completamente diferentes, o sentimento de perda é o mesmo. Ninguém deveria passar pelo que estou passando neste dia, acredito que um sentimento, por mais que possa ser mantido no seu íntimo para sempre, ele pode ser explorado de outras maneiras, principalmente as palpáveis.

            28 de julho de 2020, há exatamente 19 anos atrás eu conheci o amor da minha vida. Eu posso considerar que esta história seja piegas e um verdadeiro clichê, mas independentemente do que as pessoas pensem ou acreditem, eu posso dizer que amei.

            Conheci Ana Paula no colégio, no segundo ano para ser mais específico. Ela era a aluna nova e chamou a atenção dos marmanjos de toda a escola. Eu, que não podia perder a oportunidade, dei logo um jeito de me aproximar e investir bravamente na garota mais interessante do pedaço. O fato de todos a desejarem não era apenas porque ela era bonita, tinha pernas bronzeadas que deixavam qualquer um doido, principalmente quando usava minissaia; Ana era simpática, logo que chegou fez amizade com todo mundo, se enturmou facilmente, e ainda, era destaque nas aulas. Sabia de tudo, estudiosa que só. Foi amor à primeira vista.

            Quando, com 16 anos, a convidei para sair, foi algo surreal. Umas daquelas vitórias diárias que adoramos colecionar e esfregar na cara dos amigos. Nessa época éramos todos moleques e sair com a Aninha era o maior prêmio que podíamos ter. Sorte que fui eu o escolhido.

            Lembro muito bem que os outros caras, inclusive do terceiro ano, ficaram boquiabertos quando ela optou por mim. A escolha não era evidente, afinal eu, não era o galã bam-bam-bam da escola, não era o mais inteligente ou descolado, mas por algum motivo, que até hoje desconheço, ela me escolheu.

            Depois disso, a pedi em namoro, fomos a mais cinemas, festas, começamos a frequentar a casa um do outro, conheci os pais (que dia difícil...), parques, piqueniques, noites sozinhos quando os sogros viajavam e tudo seguia como planejado.

            Ao se passar quase dois anos inteiros, nosso amor só aumentava. Estávamos em época de vestibular e nosso destino poderia ser definido em breve. Em um de nossos passeios aos sábados, sentamos em um banco, que já era praticamente nosso, em uma praça perto de casa; lá era o lugar perfeito para nos encontrarmos e ficarmos abraçadinhos, muitas vezes em silêncio. O banco ficava embaixo de uma árvore enorme, centenária, cujas folhas caiam lentamente, eram pequeninas, leves e sempre grudava em nossos cabelos. Toda vez que estávamos tristes por qualquer razão, ficávamos lá, comtemplando a paisagem e com as mãos dadas.

            Um belo dia resolvemos sentar bem nas raízes expostas daquela árvore. Aninha começou a chorar, pois ela teria que ir embora para outro estado para estudar Medicina e eu ficaria em nossa cidade. Nós sabíamos que não seria mais a mesma coisa. Como uma forma de eternizar o que vivemos, com um canivete que ganhei de meu pai, marcamos nossas iniciais naquele tronco histórico e fizemos um coração em volta. Ana chorava enquanto me abraçava e dizia que me amaria para sempre. Eu, que tentava não demonstrar tantas emoções, segurei as lágrimas, mas no fundo queria gritar e pedir que ela ficasse, mas jamais faria isso. Era o sonho dela e deveria o seguir.

            Depois de algumas semanas nos despedimos. Foi a época mais triste de minha vida. Com o tempo, fui me obrigando a viver; me levantava, ia para a faculdade, arrumei um trabalho, mas para falar a verdade, não via mais graça nas coisas.

            Meses se passaram e todos os dias eu visitava nossa marca na raiz daquela árvore. No começo falávamos todos os dias, mas com o tempo, tudo vai se afastando. Anos se passaram, nunca mais nos falamos, a acompanhei pelas redes sociais, mas sempre sem falar nada. Soube que ela se casou e parecia estar bem sucedida no programa de residência. Eu, que fiquei na nossa cidade, também conheci alguém, levei a vida, gostei, e ainda gosto. Passei por coisas trágicas, como um acidente de carro, a perda do meu tio e padrinho que sempre me apoiou, perdi o emprego que tanto gostava, mas sempre me lembrava do grande amor que vivi.

            Hoje, quando fui à padaria comprar brioches para minha esposa, levei um susto. Meu mundo desapareceu, um sentimento que já era para estar enterrado ressurgiu. Eu chorei, e muito, como um bebê.

            Com o objetivo de ampliar a avenida principal, cortaram a árvore da nossa praça. Um tremendo choque, mas a vida deve seguir. Apesar desta nova ferida, é hora de secar as lágrimas e comprar os brioches, já que minhas lembranças foram roubadas.


Bruno Lopez


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