MEU GUARDA-CHUVA, NÃO!

 



Era só mais um dia comum em Manhattan. Eu estava vivendo lá por um tempo, e como bons hábitos nunca mudam, tratei de fazer o cadastro na biblioteca para poder usufruir de quantos livros eu pudesse.

Confesso que sempre achei chique a ideia de me imaginar entrando na Biblioteca Pública de Nova Iorque. Eu, desde criança, via nos filmes e séries, aquele parque maravilhoso, o movimento em volta, a construção colossal, e tudo que compunha aquele ambiente perfeito, para mim. Quando tive a oportunidade de morar na cidade, por alguns meses, devido a um curso que me matriculei, não podia perder a oportunidade de viver como um bom nova iorquino, ou pelo menos, o que eu imaginava ser um.

Toda terça-feira eu tinha o dia livre, então o separava para explorar a metrópole, conhecer os pontos turísticos, e claro, ir àquele santuário dos livros. Ao atravessar o Bryant Park e chegar na porta da biblioteca, uma emoção batia forte. Quando eu finalmente conseguia entrar, era como se o mundo parasse e nenhuma preocupação mais importasse.

Apesar da boa sensação e gostar de ficar lá dentro, eu sabia que tinha outros compromissos e que não podia demorar tanto. Mas como não parar e ficar olhando para o teto daquele lugar? Era fascinante...

Naquela terça, em especial, eu não podia me demorar, pois tinha um compromisso com alguns colegas no Brooklyn, então devia me organizar para dar conta de tudo. Peguei um livro de contos infantis, afinal era mais fácil para ler em inglês, e parti para a segunda parte do ritual: curtir a leitura das primeiras páginas sentado na mesinha de algum café naquele lindo cartão postal. Eu fazia isso sempre. Sentava, pedia um café pequeno, que para mim já era grande, colocava minha mochila (e tudo que carregava, afinal, por ali, precisava carregar blusa e guarda-chuva para qualquer lugar) na cadeira ao lado, respirava com os olhos fechados para sentir o cheiro da cidade (ultimamente tomado de maconha, mas valia a intenção), e começava a ler.

De repente, uma senhora muito elegante, com os cabelos roxinhos, se aproximou de mim, me olhou com um olhar tenso, parecia controlar seus movimentos e... pernas, para que te quero?

A senhorinha, aparentemente fofa, pegou o guarda-chuva da cadeira e saiu correndo. Eu achei aquilo tudo um desaforo, e instintivamente, saí correndo atrás dela. Onde já se viu, um abuso daqueles? Ela era bem mais velha, facilmente eu a alcançaria.

Engano meu, a velhinha era boa demais para fugir. Atravessava ruas e avenidas no meio dos carros, olhava para trás, para garantir que eu tinha desistido, mas ao me ver, continuava. Corria, se escondia, mas parecia não se cansar, ao contrário de mim que já estava pedindo arrego, me embananava todo para atravessar as ruas, mas como eu corria bem mais rápido, ainda assim, eu conseguia a manter em vista.

Esse percurso durou cinco longos quarteirões, quando a mulher, aparentemente cansada, decidiu entrar em uma loja do Dunkin Donuts da Segunda Avenida. Eu, também exausto, parei, respirei, tentei me recompor e senti a brisa fria que passava por mim. Devido à correria, eu nem tinha colocado a blusa naquele frio. Meu foco era resgatar meu guarda-chuva comprado nas lojinhas de souvenires da Times Square. Era simplesinho, mas foi pago em dólar, não era uma idosa qualquer que ia tirar de mim no preço que está essa moeda, não mesmo.

Ao puxar a porta do estabelecimento, o sininho de cima tocou notificando a entrada. Logo vi a ladra sentada em uma banqueta próxima ao balcão de pedidos. Com muito medo do que eu faria, ela me olhava, fazendo a desentendida.

— A senhora é difícil, hein? Mas, por favor, devolva meu guarda-chuva. — Falei no idioma dela.

— Desculpa, mas esse guarda-chuva é meu. — Respondeu a mulher.

— Não me venha com essa, a senhora pegou das minhas coisas e sabe bem disso. Devolva agora.

— Espera! Esse daqui é meu! Eu tinha esquecido lá no café e voltei pegar quando você já estava lá. Eu percebi que não era daqui e não sabia se me entenderia, então o peguei e você começou a me seguir. Fiquei com medo.

— Ah, sério? Essa agora? E onde está o meu?

— Eu não sei. Já pensou em olhar na sua mochila?

— Ah, por favor, minha senhora...

Para provar o que estava falando e acabar de uma vez por todas com aquilo, abri minha bolsa e a mostrei.

— Não seria este daqui, meu jovem? — Perguntou a mulher apontando para dentro da mochila.

OMG! Ela estava certa. Que vergonha! Eu não sabia o que fazer. Sem jeito nenhum, simplesmente disse:

— Sim é esse mesmo. Que bom que tudo ficou claro. Me desculpe e não saia correndo por aí.

Sem olhar para trás, saí em passos rápidos, dos quais pareciam mais velozes que minha própria corrida. Ao fechar a porta, encostei no muro do prédio vizinho, respirei, limpei o suor de nervoso, arrumei meu cabelo e comecei a rir. Era muito absurdo aquilo tudo, como eu não percebi que eu nem tinha pego o objeto em minhas mãos? E sair desembestado atrás de uma pessoa nas ruas? Que sufoco... e ainda quis parecer que estava certo para ela. Que doideira!

Enfim, tinha que engolir a humilhação e seguir meu cronograma.

Café da manhã? Ok.

Ir à biblioteca? Ok.

Corrida matinal? De certa forma, ok.

Pagar mico em público? Ok, com certeza.

Ir ao Brooklyn em busca de novas aventuras e histórias para contar? Era só pegar o metrô na 42 e escolher a melhor hora para uma nova confusão.


Bruno Lopez


DÁ UMA OLHADA EM ALGUNS DOS LUGARES EM QUE O TEXTO SE PASSOU!

Para matar a saudade de quem já visitou a cidade, e para quem sonha em conhecer esses lugares incríveis...



Comentários

  1. Quem nunca pagou um mico desse tipo!?...Amei!!...😁😁😁❤🥰💋

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    1. Não é? Às vezes estamos tão distraídos com alguma coisa que nem percebemos os detalhes hahahaha

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  2. Respostas
    1. Cada coisa que pode acontecer... pelo menos a gente se diverte, rs.

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  3. Simplesmente demais rsrsrsrs
    Quem nunca na vida já não pagou um mico
    Amo a forma como os contos nos coloca dentro deles e nos faz sentir como seria se estivesse passando pelo mesmo que mico mais em Nova York tá tudo certo rsrsrs

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    1. Que bom que conseguiu se ver no mico da história hahaha... É o que sempre digo... vai passar vergonha, tudo bem, mas que seja em NY :p

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  4. Não sei, mas vi você nessa situação kkkk os melhores micos kkkkk

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    1. HAHAHAHHA pior que é tão minha cara isso, mas não aconteceu comigo, ainda bem, rs.

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