BILHETINHOS


Era como se alguma coisa estivesse me puxando, eu sabia que estava ainda ali, naquela cama, mas ao mesmo tempo, parecia que apenas o meu corpo permanecia lá. Minha alma, ou o que quer que fosse, vagava lentamente pelo quarto. Primeiro, ainda ouvindo as pessoas que me acompanhavam, eu via o teto, e aos poucos ia me aproximando dele.

Depois, com movimentos leves e com as vozes cada vez mais distantes, eu percebi que podia me ver. As máquinas lá embaixo apitavam de um modo contínuo e todos pareciam estar com pressa. Eu vi enfermeiros me dando choques, minha médica triste, mas ainda assim, lutando por mim, vi o desespero em todo mundo, que apesar de acostumados àquilo, não queria mais um na conta dos mortos.

Eu podia saber como estavam se sentindo e trabalhando para reverter o quadro, mas eu não tinha mais dores, não me incomodava com emoções, porque tudo que eu podia ouvir era uma voz suave me chamando, parecia que ao longe haviam sinos também. O doce chamado era irresistível, eu ainda lembrava de como doía estar naquele corpo, e obviamente, não queria mais. Eu merecia descansar e ser feliz.

Como quando respiramos profundamente, me joguei ao nada e a voz foi ficando mais próxima, tudo ao redor ficou embaçado e eu não podia ver mais nada. Fechei os olhos, respirei mais uma vez, mas percebi que era um vício já desnecessário. Não havia dor, sentimentos ruins e nem arrependimentos ou medos, apenas a tranquilidade.

Até então, eu nunca soube se havia feito a diferença na vida de alguém, mas como num passe de mágica, algo me puxou com tanta força e velocidade, que fui até o quarto do hospital em tempo recorde. Ninguém mais tocava em mim, mas havia tensão no ambiente. Como um imã que sugava, a atração para entrar novamente naquele homem já velho, foi irresistível.

Abri os olhos e senti meu coração disparar. Todos choravam ao redor, incrédulos. Recebi um abraço de cada vez.

— Suas palavras mudaram nossos dias. — Disseram.

Enquanto eu estava internado, sempre aconselhei os profissionais que me ajudavam a lutar pela vida, com dicas e mensagens de afeto. Segundo eles, eu fiz a diferença e o mundo ainda precisava de mim. Eu nunca havia percebido isso, mas certamente deixei ensinamentos por onde passei e ainda passarei.

Hoje, já em casa. Apesar de sozinho, escrevo bilhetinhos com frases de consolo para distribuir por onde passo e acalmar os corações aflitos. Se eu puder mudar a vida de mais alguém antes de seguir os sinos, assim o farei, para que a viagem seja ainda mais encantadora.

Bruno Lopez


 

Comentários

Postar um comentário

Conte o que achou do texto...

MAIS POPULARES