O TAXISTA


                O meu dia estava tão insano que nem percebi as horas passarem. Eram tantas coisas a fazer, tantos problemas a resolver, que quanto mais eu trabalhava, mais coisas apareciam. Em um lapso de sobriedade me dei conta que estava atrasado para minha terapia, o único momento que eu tinha paz durante a semana.

                Ao abrir o aplicativo de carros, percebi que ninguém queria aceitar minha corrida, mas eu precisava ir, estava lutando contra o relógio. Decidi então, descer do prédio e estender a mão para o primeiro táxi que passasse. Me senti naqueles filmes em Nova Iorque, mas a realidade era um pouco diferente, muitos passavam e poucos sequer me olhavam.

                Com alguma insistência, um carro preto encostou e pude subir. O motorista me cumprimentou e perguntou para onde iríamos. Eu, que já sabia o endereço decor, falei e fiquei espantado como ele simplesmente agradeceu e deu partida no automóvel.

                Como pode alguém não usar GPS? Será que ele sabia mesmo onde ficava a clínica? Será que eu estava caindo em um golpe? Eram tantos pensamentos negativos que vinham a mente, que eu mal podia me concentrar em relaxar e curtir a paisagem urbana maravilhosa que minha cidade oferecia.

                — O ar está bom?

                — Está sim. Eu disse.

                — Com esse trânsito a gente vai demorar um pouquinho, tudo bem?

                — Então você sabe de cabeça onde fica?

            — Mas é claro. Nós taxistas estudamos toda a cidade, sabemos cada cantinho por onde podemos ir, mas as pessoas insistem em usar os aplicativos...

                  — É pelo preço, né?

               — Nem sempre preço baixo é a melhor opção, mas eu entendo. As vezes demoramos para perceber o que é melhor para nós e ficamos insistindo no erro mesm oque a resposta esteja na nossa frente e gritando.

                Aquele curto diálogo me fez pensar muito sobre como eles se preparam para exercer sua função, enquanto muitos desses motoristas aleatórios mal sabem dirigir. É claro que não dá para generalizar e nem comparar os valores, principalmente para quem usa com frequência, mas é um caso a se pensar.

                O trajeto estava mais demorado do que o costume, e eu comecei a respirar e pensar sobre o que eu falaria na sessão daquele dia. Eu estava tão sufocado ultimamente pelo meu trabalho, me sentia cansado de tudo, queria mudar, mas não conseguia. Em todos os momentos eu estava com o celular em mãos, buscando contatos e resolvendo coisas que outras pessoas poderiam, sem sobra de dúvidas, fazer em meu lugar. Um constante medo tomava conta de mim. Será que alguma verdade estava gritando na minha cara e eu não estava percebendo?

                Em minhas dezenas de sessões, a terapeuta sempre falava dessa minha necessidade de controlar tudo, e que em algum momento, eu precisaria fazer o que eu realmente queria, me soltar, me permitir. Só de pensar em fazer algo fora do planejado já me dava agonia. Eu nunca fazia nada de surpresa, nada que fosse chocar as outras pessoas, por medo de manchar minha reputação, ou de que os outros pensariam a meu respeito.

                E foi em um surto de “agora ou nunca” (e também refletindo sobre as poucas e sábias palavras do taxista) que eu olhei pelo vidro do carro parado e vi pessoas correndo, passeando com crianças e vivendo suas vidas em um parque da cidade. Lá era tão arborizado, parecia ter apenas o som da natureza mesmo estando cercado de buzinas. E foi assim: que eu dei ao motorista uma nota, abri a porta e fui em direção ao desconhecido.

                Não sei explicar o que senti, mas foi uma necessidade em suprir o que eu desejava mais forte do que tudo, eu queria sair do carro, viver aquela experiência, sentir o sol bater no meu rosto, ter independência sem preocupação. Larguei tudo para trás, não compareci à consulta e vivi aquele momento, do jeito que eu quis. Eu parecia uma criança vendo as coisas pela primeira vez.

                Desde então tenho valorizado mais o presente e tentado fazer cada dia mais uma coisa que me agrade. Nada de trabalho até tarde, nada de centralizar todas as responsabilidades, eu decidi viver a vida que eu queria ter. As surpresas estão sempre onde menos esperamos, e graças aquele taxista, hoje eu encarei as mudanças que desejava ter.

Bruno Lopez


 

Comentários

  1. Meu Deus, na simplicidade das suas palavras, me enxerguei...preciso sair do carro e viver cada vez mais todos os momentos ❤️❤️❤️

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  2. É exatamente o que estou fazendo
    ...Vivendo o hoje e desfrutando do aqui e agora!...Amei o texto!...Bjs, querido!...❤❤❤💋

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